JORNAL VIRTUALPROFISSĂO
MESTRE
Profissăo Mestre – Ano 7 Nº 113 – 17/04/2009
A questão aluno e professor não pode ser discutida desconectada de um
terceiro elemento: o conhecimento. A
importância de sua inserção nesta
relação repercute sobre as formas como
poder e saber se fazem sentir entre
docentes e discentes, modificando
significativamente o modo como ambos se
tratam e como tratam o que deveria
uni-los.
Na educação básica essa relação tem sido
exaustivamente discutida, não sendo,
porém, tão amplo o seu estudo no ensino
superior. Uma das razões que justificam
essa opacidade do assunto me parece ser
exatamente o modo como o conhecimento é
inserido na docência da graduação e até
mesmo na pós-graduação: parece permear a
relação ensino-aprendizagem como algo
dado e não como uma construção elaborada
em conjunto.
O pressuposto de que o conhecimento
neste nível de ensino não carece da
subjetividade dos sentimentos, da
empatia, da dimensão afetiva, parece
coincidir com a pretensa hierarquia
educacional: na academia, a relação
professor e aluno não pode ser
“infantilizada” por esses aportes,
precisando assumir “ares” de
neutralidade e objetividade científica –
mesmo que esses princípios estejam
superados no discurso da produção
científica contemporânea.
As pesquisas efetuadas com alunos sobre
professores do ensino superior confirmam
largamente essas reflexões iniciais ao
apontarem como qualidade desejada e
reconhecida como mais importante no
desempenho desse profissional o “domínio
do conhecimento”, a “capacidade de
produção e de pesquisa” e a “experiência
competente no ramo profissional do curso
onde ensinam”. Não que se conteste a
importância dessa característica,
afinal, não é em busca desse
conhecimento que os alunos vêm à
academia? Contudo, a diferença entre a
pontuação atribuída a esse quesito e
outros seguintes, desvela a cultura
“conteudesca” que ainda orienta a vida
acadêmica.
As próximas indicações do “bom
professor” são encaminhadas na
perspectiva de um profissional capaz de
“respeitar o aluno”, de “possuir
didática”, “de possuir domínio de
turma”, de “saber avaliar” numa
proporção muito aquém daquela
considerada primordial e com pouca
relevância no que concerne às relações
pessoais de afeto ou de formação
complexa do ser humano.
A despeito desses resultados é possível
obter registros de estudantes que
afirmam a importância dos elos de afeto
estabelecidos com professores.
Evidentemente que as relações em sala de
aula resultam de combinados explícitos
ou não do desempenho de ambos os atores
envolvidos. Há razões para se acreditar
que é possível alcançar um bom nível de
aprendizagem num clima de estudo sem
nenhum envolvimento pessoal que não seja
outro que o objetivo comum de aprender e
de ensinar. A postura séria,
compromissada com a produção científica,
pode anular desentendimentos
corriqueiros na relação professor, aluno
e conhecimento, bem como a postura
distante e arrogante de professores -
que nem precisam ser compromissados para
obterem respostas submissas e, também,
admiração de seus alunos. Essas atitudes
parecem pretender desvencilhar do
cotidiano a ocorrência de problemas com
o desrespeito às explicações,
simulações, pesquisas, exercícios e
demais procedimentos metodológicos do
ensino.
Muitas vezes, segundo relatos colhidos
junto a professores e a alunos
universitários, esta tem sido a fórmula
consagrada para o considerado padrão de
êxito em cursos ou disciplinas no ensino
superior. Há, também, registros de uma
reverência muito expressiva dos alunos
em relação aos professores que denominam
“carrascos”, “infernais” e
“inacessíveis”. Esses profissionais
costumam reunir um séquito de fiéis
seguidores em suas disciplinas e seus
grupos de pesquisas. Há uma conjuntura
quase que folclórica em torno das
dificuldades e/ou exigências por eles
impostas aos alunos, as quais
transformam tais disciplinas ou
orientações como as mais importantes dos
cursos, aquelas mais ferozmente
disputadas nas inscrições e matrículas.
Então, esse mesmo culto aos professores
“infernais” banaliza outros docentes que
buscam transformar suas aulas, cursos ou
disciplinas em espaços-tempos de
formação humanística, críticas, mas numa
perspectiva que reúna conhecimento e
afeto para construção de um mundo mais
justo e uma sociedade mais apaziguadora.
Não se incluem nessa categoria os
professores “laissez faire”,
“permissivos” ou do tipo “bonzinho”,
reconhecidos imediatamente pelos alunos
como aqueles que visam “não dar trabalho
para não ter trabalho”. Essa categoria,
identificada pelos alunos que alardeiam
entre si como agir com eles, é
contestada por alguns e ignorada por
outros.
As relações entre esses dois últimos
grupos de professores são marcadas por
tensões diferentes: no primeiro grupo,
as tensões são decorrentes do embate
entre pessoas que vivem a complexidade
do aprender e do tecer conhecimentos.
Geralmente são tensões que enriquecem
aprendizagens, que exemplificam o viver
em sociedade, propiciando mudanças de
atitudes e oportunidades para elaboração
de novos valores. Podem ser amenizadas
por combinados de soluções encaminhadas
a priori ou a partir dos acontecimentos,
gerando reconhecimento do bom senso, da
experiência, capacidade de julgamento e
flexibilidade diante da evolução dos
fatos cotidianos.
As tensões gestadas nas relações com
professores inflexíveis e com
professores permissivos, geralmente, são
mais graves e com resultados
desgastantes não apenas para docentes e
discentes, mas também para as
instituições em que se inserem. As
consequências para alunos com os
professores de “linha dura” são
empobrecedoras para posterior aplicação
em sua vida profissional, pessoal e em
sua cidadania, se revelando em
cristalização de leis pouco éticas ou
pouco humanitárias. Limitam-se, também,
à aceitação de imposições finais para se
evitar maiores perturbações, gerando
aprendizagens de submissão ao
aparentemente mais forte, dissimulações
ou murmúrios inúteis, sem produções de
resistências modificadoras.
Algumas das possibilidades que
professores podem se valer para criarem
um clima mais produtivo e menos propício
às tensões dispensáveis no decorrer de
suas aulas e disciplinas são elaboração
de aulas dinâmicas, com variedade de
metodologias para atendimento às
diferenças individuais; práticas de
resolução de conflitos pautadas pela
transparência nas decisões e critérios
de aproveitamento de aprendizagens;
valorização de saberes prévios e
construídos dos/pelos alunos; posturas
democráticas que permitam/estimulem a
autonomia dos estudantes; tratamento
respeitoso e cordial alimentado por uma
postura ética, profissional e amorosa.