Joana e Tomás são dois jovens que sofrem de dislexia. Sentem-se diferentes porque olham para eles de outra maneira. Estes dois jovens contaram ao Destak a sua experiência que se confunde com a história da sua vida escolar.
INÊS CARRANCA
“Sinto-me diferente porque me sinto inferior aos outros”. Joana tem 17 anos e sofre de dislexia, um problema que afeta 10% a 15% da população escolar. A dislexia é uma dificuldade de aprendizagem a nível da escrita, da leitura, da ortografia e da matemática, muitas vezes associada a uma capacidade mental inferior. Mas a verdade, é que os disléxicos possuem, na sua maioria, um quociente de inteligência superior à média normal. Grandes gênios da nossa história sofriam de dislexia como Albert Einstein, Pablo Picasso, Winston Churchill, entre outros.
O disléxico usa o pensamento não-verbal, ou seja, o significado da linguagem é feito através da construção de imagens mentais que irão resultar em conceitos e idéias. “À medida que vou lendo o texto em vez de me focar nas palavras, vou traçando o sentido do texto através de imagens. As imagens traduzem-me as palavras”.
Para Joana a dislexia é um tabu. Faz questão que o seu círculo de amigos não saiba que tem esta dificuldade. A dislexia foi-lhe diagnosticada por volta do 3º ano. Os pais notavam dificuldades na leitura, na escrita e principalmente na matemática. A Joana “não diferenciava o sinal “+” do sinal “-“ nem o sinal > (maior) do sinal < (menor)” diz Maria, a mãe de Joana. “Era desinteressada e não se concentrava por mais de cinco minutos porque como não entendia o que muitos trabalhos de casa ou testes lhe pediam, deixava de se preocupar”.
Confrontada com o problema, a professora limitava-se a não compreender a dificuldade e “fazia de propósito perguntas sabendo perfeitamente que derivado ao meu problema, principalmente com a matemática, eu não sabia responder”, recorda Joana. “Chamava-me constantemente burra e fazia questão de mostrar perante a turma toda que eu sabia menos que os outros”.
A falta de informação e formação dos professores fazem passar casos de dislexia em branco e o rótulo dado ao aluno é o de insucesso escolar. O Ministério da Educação não investe na formação dos professores e os próprios desinteressam-se por saber mais. O artigo 319º protege crianças que sofram de dislexia, deficiência mental, auditiva, visual e motora, dando a estas crianças benefícios no processo de avaliação. Num colégio que freqüentou Joana não pôde estar ao abrigo deste artigo porque o colégio não aceitava. Por ser assim, a Joana tinha na turma mais de 20 colegas, não tinha tempo extra para fazer os testes nem a atenção educativa a que tem direito por ser disléxica.
Quando interrogada sobre o problema da dislexia e os mecanismos de resposta do Ministério da Educação, uma professora do secundário pertencente ao gabinete de ensino especial da DREL (Direção Regional de Ensino de Lisboa), refugiou-se no artigo 319º e explicou as dificuldades e as respostas que são dadas aos deficientes mentais, auditivos, visuais e motores deixando fora das suas explicações as crianças disléxicas.
De 25 alunos de uma turma, três têm probabilidades de serem disléxicos. “No geral, a formação dos professores nesta matéria é muito insuficiente e as escolas não têm condições para lidar com a dislexia, o que é dramático”, afirma Helena Serra, a vice-presidente da APDIS (Associação Portuguesa de Dislexia).
A resposta do Ministério da Educação aos casos de dislexia baseia-se no artigo 319º onde, entre algumas cláusulas, é dado mais tempo ao aluno para executar um teste de avaliação, os parâmetros de avaliação são diferentes e as turmas são encurtadas para que o professor possa dar mais atenção ao aluno com dislexia.
Tomás, 17 anos, também sofre de dislexia. Diz que não se sente diferente mas que “os professores encarregam-se disso. É difícil para os próprios professores acreditarem que alguém é diferente dos outros”. Quando lhe foi diagnosticada dislexia, os pais transmitiram à escola o problema de aprendizagem que o Tomás tinha. A solução que a escola encontrou foi eliminar os intervalos que supostamente eram para espairecer e brincar. “Enquanto os outros iam brincar, eu ficava a trabalhar para compensar aquela falha, a dislexia”.
No caso da Joana, a professora não soube interpretar as dificuldades da criança, tendo como resposta para o insucesso o adjetivo “burra”. No caso do Tomás os professores diziam que “o problema era a falta de estudo e a rebeldia. E que a dislexia era uma desculpa para as minhas asneiras”.
Os principiais sinais de alarme são, no principio, o começar a falar tarde ou escrever o nome em espelho. Mas os sinais tornam-se mais evidentes quando a criança começa a aprender a ler e a escrever e demonstra, por exemplo, lentidão na aprendizagem dos mecanismos da leitura e da escrita, dificuldades na leitura, inventando palavras ao ler um texto ou ao escrever com muitos erros ortográficos.
A Joana e o Tomás freqüentam, atualmente, o décimo segundo e o primeiro ano da faculdade respectivamente e são adolescentes conscientes do problema que têm. São acompanhados em sessões semanais por uma psicopedagoga que lhes ensina de uma maneira própria a matéria que têm para aprender.
Uma ajuda fundamental para que os outros não sintam a diferença deles.
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