Jorge Forbes
Artigo publicado na revista WELCOME Congonhas, julho de 2007 - ano 1 - número 4
Não tive tempo: de te ver, de te responder, de concluir a apresentação, de entregar o artigo, de cumprir o prazo, de viajar, de ir ao banco, de consertar a luz. Não tive tempo nem de te explicar que não teria tempo, pois, quando vi, já era, já tinha passado o tempo.
Não tive tempo, me explicaram: estou estressado. Começa assim, a gente se esquece dos amigos, deleta alguns (isso até que é sadio), fica sem dormir, tem um pouco de azia, agride de repente, ri de repente, quando viu, já foi. Depois piora: vem a úlcera, a angina, o esquecimento repetido. E tudo se conclui na paralisia generalizada, dos órgãos e da vida. Deram até nome de doença para isso: “burnout”. Engraçado, outro dia uma jornalista de um grande diário ligou para me entrevistar sobre a Síndrome de Burnault (pronuncia-se Burnô), famoso psiquiatra francês. Estava em dia de humildade e disse não o conhecer – para pasmo da moça, que sabia da minha formação na França, mas prometia pesquisar. Um pouco decepcionada, ela me conferiu 30 minutos. Sempre o tempo. “Googlei” e nada. Falei com colegas e nada. Esgotado o prazo, um pouco envergonhado, liguei para ela e confessei minha ignorância. Foi aí então que ela, consternada por meu estado, resolveu dar mais elementos, que me fizeram reconhecer que o grande psiquiatra francês, doutor Burnault, inventor da síndrome com o seu nome, não passava do fenômeno descrito, pelos americanos, como “burnout”. Convenhamos que, se for para inventar nome que nos acalme pela falta de tempo, até que é mais criativo o “Burnault” que o “burnout”.
Não tive tempo é o que dizemos quando temos que optar. A grande oferta atual nos obriga à opção, a escolhas incessantes, uma vez que uma das principais características do laço social na globalização é a falta de um modelo único com capacidade de hierarquizar as oportunidades. Estresse, nesse contexto, nada mais é que covardia da escolha, pois não há escolha sem risco. Melhor colocado assim, na responsabilidade da pessoa. Estresse deve ser tratado com escolha, ponto. É muito perigoso pensar que não se precisa escolher, que se pode fazer tudo ou ficar com tudo; aí, é infarto na certa. Dizer que a pessoa está estressada porque tem muita coisa para resolver, ou escolher, é semelhante a afirmar que alguém está gordo porque só almoça em restaurante de bufê e come todos os pratos por diplomacia. Não ficaria bem comer só a picanha de boi, desprezando a pobre galinha e não dando bola para o porquinho à pururuca.
Não tive tempo é o que diz o presunçoso conferencista: “Senhores e senhoras, desculpem-me, mas não tive tempo para lhes falar mais...”. Claro, do contrário, teria revelado todos os segredos da humanidade. Sejamos honestos e, se for para pedir desculpas, que seja mais ou menos assim: “Senhoras e senhores, desculpem-me, mas não tive tempo para ser mais breve”.
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