Ocupados e pré-ocupados: modo sufocante de viver


Sabemos que a rivalidade e a competição, o desejo de poder e de resultados imediatos, a impaciência e a frustração e, acima de tudo, a angústia e o medo, criam suas exigências e preenchem todos os espaços vazios em nossa vida.

Enquanto nossas mentes, nossos corações e nossas mãos estiverem ocupados, poderemos evitar o confronto com as questões dolorosas, às quais não queremos encarar. “Estar ocupado” tornou-se uma obsessão, um símbolo de status, e as pessoas incentivam umas às outras a manter o corpo e a mente em constante movimento. “Estar ocupado”, em contínua atividade, com agenda cheia, quase se tornou um modo habitual de viver, sem tolerância por um momento de silêncio e repouso. Aqui não há lugar para espaços contemplativos e gratuitos.

Esse é o problema do mundo moderno:  a agitação e a preocupação se tornam um estilo de vida e acabam controlando nosso ritmo cotidiano, tornando-se fonte inesgotável de ansiedade.

Em nosso padrão cultural, somos pressionados a mostrar o tempo todo que estamos ocupados e “produ-zindo” alguma coisa. Vivemos perdidos numa floresta de compromissos e atividades, incapazes de perceber alguma trilha estreita para poder andar e respirar. Mesmo com tudo que foi inventado para facilitar a vida – celular, internet, e-mail, mensagens instantâneas – parece que não temos tempo para nada.

Há muita inquietação por baixo das águas do cotidiano. Acuados pelo relógio, pelo ativismo, pela agenda, pela opinião alheia, disparamos sem rumo feito hâmsteres que se alimentam de sua própria agitação.

 

Isso explica por que o silêncio é tão difícil. Muitos dizem desejar o silêncio, a calma, a quietude, a oração pacificadora, mas não conseguem suportar tempos e espaços repousantes. Ficar sossegado é perigoso: pode parecer doença. Recolher-se dentro de si mesmo e uma ameaça.

É cada vez mais desafiante criar espaço aberto e receptivo, onde algo novo possa acontecer a nós; do mesmo modo, é urgente oferecer um espaço onde as pessoas possam se desarmar, deixar de lado suas preocupações e ocupações, e ouvir com atenção as vozes interiores. 

S. Inácio, na sua espiritualidade, nos faz questionar continuamente:

                        Qual o sentido e a direção daquilo que fazemos? Para quê? Para quem?

                       Qual é a intenção ou a motivação que está por trás de nossa ação?

Esta “dica” inaciana nos ajuda a superar a ansiedade e a pressa, harmonizando-nos com o tempo e fazendo as pazes com o relógio. Normalmente, vivemos ações ‘in-sensatas’, ou seja, sem sentido, sem direção.

Se fizéssemos uma faxina em nossos compromissos e deveres, boa parte desapareceria rápido no ralo do bom senso. Se examinássemos o baú de nossas prioridades, certamente a arrumação interior seria outra.

Aliviar a vida, o coração e o pensamento... eis o desafio; não para inventar de acumular ali mais alguns compromissos estéreis e sem sentido.

Na verdade, a pré-ocupação é um empecilho muito maior que a ocupação.

Tornamo-nos pessoas bastante preocupadas, com medo da solidão sem nome e da solidão silenciosa.

De fato, nossas preocupações evitam que tenhamos novas experiências e nos mantém nas trilhas conhecidas. A preocupação é a maneira medrosa de manter as coisas como estão; parece que preferimos uma certeza ruim a uma incerteza boa (por quê deixar o certo pelo duvidoso?)

As preocupações ajudam a manter o mundo pessoal que criamos e bloqueia a transformação revolucionária. Nossos medos, incertezas e hostilidades nos fazem preencher nosso mundo interior com idéias, opiniões, julgamentos e valores, aos quais nos agarramos como se fossem preciosas propriedades.

Em vez de olhar de frente o desafio de novos mundos que se abrem e lutar em campo aberto, escondemo-nos atrás dos muros de nossas preocupações.

Jesus Cristo revelou que nossas preocupações impedem a vinda do Reino, ou seja, do novo mundo.

Não podemos esperar que algo realmente novo aconteça se nossos corações e mentes estão tão cheios com nossas preocupações que sequer ouvimos os sons que anunciam uma nova realidade. 

Mt. 6,25-34; Lc. 12,22-32 – Jesus aponta para a verdadeira “pré-ocupação”, o desejo que preside a todas as nossas ocupações. Pois, se a pré-ocupação não está bem ordenada, todas as nossas ocupações carecerão de sentido e ficarão vazias.

E a “pré-ocupação” deve ser o Reino de Deus e sua justiça.