Matéria do Jornal Estado de Minas conta com comentário da Pedagoga Jane Haddad.
Fenômeno dos clubes de compras chega ao ensino e promete oferecer de idiomas a pós-gradução com desconto, superando desafio da manutenção da qualidade
Junia Oliveira
Publicação: 23/08/2011 06:00 Atualização: 23/08/2011 06:20
No início era o verbo. E ele se escrevia a bico de pena, lápis, caneta. Depois, veio a máquina de escrever e a revolução do computador. O verbo continua, mas em formas a cada dia mais tecnológicas. Na era da internet, até ele entrou com tudo na onda, na qual modas e tendências se confundem e ditam regras. Uma das mais novas febres é o verbo, conjugado sob a forma de “comprar”, nos sites de negociações coletivas. Neles, a lógica é simples: quanto mais gente, mais barato se paga. Disseminando-se por todas as áreas, era só uma questão de tempo até que a nova mania chegasse à educação. Pois chegou. Agora, é perfeitamente possível adquirir curso a distância, de graduação, de especialização e aulas de idiomas nos mesmos moldes daquela viagem mais econômica, da academia adaptada ao bolso e dos hotéis dos sonhos: em apenas um clique. Pioneira, a modalidade começou a ser ofertada em Minas Gerais na sexta-feira.
Quem quer e precisa estudar mas não tem condição financeira de arcar com a mensalidade nos patamares convencionais tem no modelo uma esperança. Os descontos, válidos apenas para novos estudantes, variam de 25% a 65% e valem para todo o período do curso. Apesar de oferecer cursos on-line, o carro-chefe do Clube Educação (www.clubeducacao.com.br) são mesmo as aulas presenciais. Pela internet, são oferecidas vagas do ensino a distância em instituições de todo o país e, presencialmente, em Minas, Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo. Belo Horizonte já responde pela quarta posição em número de acessos ao site, segundo o gerente de marketing do clube, Luís Romel.
As instituições parceiras são escolhidas com base em alguns critérios. No caso daquelas que oferecem graduação e pós-graduação, o primeiro deles é verificar se estão credenciadas no Ministério da Educação (MEC) e autorizadas a oferecer o curso proposto. O outro é relacionado aos aspectos de mercado: qual é a imagem da instituição em sua cidade e no meio no qual atua. Mesmo fazendo a inscrição pela internet, o aluno deve se submeter ao vestibular das faculdades, no caso da graduação, e aos quesitos de seleção, no caso da especialização – o que é feito diretamente na instituição. O site é apenas um instrumento de adesão. Os candidatos têm a opção de se cadastrar no clube, já que as vagas são limitadas, e ter o dinheiro devolvido se não forem aprovados do processo seletivo.
“É uma inovação e estamos em fase de divulgação do conceito, mas já há uma receptividade grande. O modelo é uma tendência, no sentido da democratização da educação superior no Brasil, e, ao mesmo tempo, algo inevitável. Trabalhamos com o conceito da ampliação do acesso à educação e da inclusão e respeitamos todas as leis e regulamentações da educação no país”, afirma Luís Romel. Para ele, não há motivo para se preocupar com o caráter de comércio envolvendo o ensino.“A educação é um bem de necessidade básica e, por isso, o clube pode ser enquadrado num negócio de utilidade pública, como saúde e alimentação”, argumenta.
Economia
A parceria em BH foi feita com a Faculdade Pitágoras, para o MBA em gestão estratégica de empresas. As vagas foram abertas sexta-feira e têm 40% de desconto – a mensalidade cai de R$ 472,22 para R$ 283. No fim, a economia é significativa: em vez de pagar R$ 8,5 mil, o estudante vai arcar com R$ 5,1 mil.
“A geração que usa a internet para buscar o que comprar em qualquer aspecto da vida dela poderá buscar também ensino. Escolhemos o clube porque ele é dirigido para a educação e atinge um nicho de pessoas que querem estudar, indo além de quem quer apenas promoção”, ressalta a gerente de mercado da faculdade, Tatiana de Lima Rocha. Ela relata ainda que, diferentemente de outros similares, o clube cobra apenas uma taxa de adesão do aluno: “Como não estou dividindo nada com eles, não interfiro no padrão do curso. Tudo que investia, continuarei investindo. Não há o argumento de que, por ser mais barato, haverá perda de qualidade”.
A promessa de aliar qualidade e preço é, realmente, um atrativo e tanto. Que o diga o estudante Maikon Leander Cândido, de 33 anos. Formado em administração em 2006, ele precisou esperar até o início do ano passado para melhorar de posição no emprego – atualmente trabalha na área de logística e finanças de uma cervejaria em Juatuba, na Grande BH – e equilibrar o orçamento familiar para encarar o MBA em gestão de pessoas, seu grande sonho. “A qualidade vem sempre em primeiro lugar, mas quando se consegue ter qualidade aliada a um desconto ou redução das mensalidades é mais atrativo. Assim, é possível dar mais oportunidades a mais pessoas”, avalia.
Palavra de especialista
Jane Patrícia Haddad
Pedagoga
O risco da banalização
“Por mais que seja uma tendência, vejo a novidade como mercantilização. Não que seja contra, mas estamos chegando a um ponto em que a coisa está sendo banalizada. Quem compra deve ter atenção à escolha do curso, ao currículo, ao histórico da instituição, verificar se é registrada no Ministério da Educação, quem são os professores e a formação deles. O diploma se tornou um produto de vendas e todos querem tê-lo, normalmente, para melhorar o salário, em nome da formação. O que me preocupa também são quais valores e princípios estão por trás disso. Como educadora, ando em alerta. As pessoas estão perdendo o poder de reflexão. Escolhem curso e não refletem, vão só pegar o diploma. Hoje, se busca a educação pelo preço.”
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