A Psicanálise nos possibilita perceber que não há apenas um entendimento, uma forma de se perceber uma dificuldade e sim vários olhares sobre um sujeito é preciso sair do senso comum , querer explicar tudo de forma simplista.
Tantos “problemas de aprendizagem” não estaria ligados a falta de sentido em apreender?
Eu pessoalmente, não consigo atuar na Clínica sem uma escuta sensível para além de diagnósticos limitantes .
Nós psicopedagogos diariamente somos convocados a trabalhar com crianças e jovens rotulados por um sistema educacional que ainda nos impõem um único tipo de aluno para um único sistema educacional padronizado que responda ao desejo do Outro .
Não há tantas respostas prontas e acabadas como estamos acreditando, o que há é um rapidez em “fechar” diagnósticos e responder a angustia da família e da escola. Não acredito que as dificuldades de aprendizagem estão sempre ligadas ao potencial cognitivo da criança.
Por que você escolheu este tema?
Acredito que sempre partimos das nossas próprias experiências e como aluna sempre fui considerada indisciplinada, hiperativa e diferente, passaram –se quase 40 anos e continuo escutando o mesmo discurso só que hoje sou uma especialista em constante formação para tentar de algum lugar facilitar a comunicação entre as diversas instituições que envolve uma criança .
Ao escolher este tema, tenho a pretensão de provocar novos olhares sobre discursos contraditórios que continua ameaçando nossas crianças e jovens.
Tenho o intuito de provocar uma (re)leitura do presente e uma mudança de discurso e postura frente a tantos desafios que a sociedade nos impõem.
A inquietação que paira nas escolas, famílias e consultórios sobre o processo ensino aprendizagem pode ser a energia que faltava para (re) pensar novas intervenções . Freud já nos alertava em seu texto: O Mal estar na Civilização: “ O mundo nos adoece, quando somos impedidos de simbolizar nosso mal estar” . A Educação precisa fazer uma interlocução real com as outras áreas sem perder sem perder sua identidade que sirva de eixo para todos os envolvidos no processo.
Qual a relação entre educação e psicanálise?
É uma possibilidade de entendermos que não é possível saber tudo , não há padrões únicos e sim sujeitos únicos. Quem sou eu? Quem é meu aluno?
Entre eu e o outro existe um mundo de subjetividades que não é contemplado na escola; o não saber ( ditos fracasso Escolar) nem sempre está relacionado a “inteligência” e sim a forma em que se estabelece o vínculo;sujeito-sujeito; professor aluno. A forma com que esta criança interagiu e interage com os adultos fará a diferença na relação com o Saber, a criança precisa confiar nos adultos para que ela possa aprender e apropriar-se do conhecimento. Saber é primeiro saber de si para que depois a criança sinta-se autorizada a saber do outro e do mundo. O que é aprendizagem contemplando apenas a Pedagogia
Qual a importância na relação escola/professor – aluno/família?
O Professor quando ingressa em uma escola ele deve lembrar-se de que ele trás sua história pessoal que se encontrará com diversas histórias. O Projeto Político Pedagógico também deve ser conhecido por todos os envolvidos no processo da criança. Os princípios da família deve ir de encontro aos escola. Acriança quando ingressa na escola , ela é fruto de uma família, que por sua vez, está inserida em uma sociedade que vem substituindo a tradição da história pela valorização do indivíduo e do prazer imediato o que naturalmente desencadeará um conflito já que está criança não terá todos seus desejos satisfeitos imediatamente.
Escola-família;professor-aluno precisam em primeiro lugar criar condições de confiabilidade.
Onde e como entra a psicanálise nestas relações?
A Psicanálise nos possibilita perceber que não há culpados por isto ou aquilo, se os pais erram na forma de educar seus filhos não é porque são ruins .Antes de ser pai-mãe-professor, há ali um sujeito que trás sua própria história marcada por experiências nem sempre elaboradas e faladas. A subjetividade é matriculada na escola junto com os ditos conteúdos, livros didáticos,fora-aula,provas que devem ser “vencidos” em tempo Record. Onde entra a relação sujeito-sujeito na escola? E o aluno que não corresponde a este tempo estabelecido? De quem é a culpa? Escola culpa a família X Família culpa a Escola... A Psicanálise deve estar atuando aí; não há culpados e sim co responsáveis por aquela criança que não consegue aprender? É preciso recriar as relações e a Escola.
Como a psicanálise vê o “Fracasso Escolar” e os problemas de aprendizagem?
A “Problemas de aprendizagem”, junto com a indisciplina e violência escolar vem sendo classificada mais uma vez no senso comum e no campo educacional por “Fracasso escolar”. O que percebo é há um recado por parte das crianças e jovens endereçado aos adultos: eles não estariam de alguma forma nos “endereçando” um protesto em forma de fracasso escolar para que repensemos sobre o como estamos fazendo educação e de que forma estamos construindo nossas relações, ou seja mediando conhecimento-sujeito?
Só há sentido em aprender se houver uma autorização por parte de quem aprende.
Eu me pergunto por que, às vezes, o desejo de saber , não se manifesta em nossos alunos?
Acredito muito nesta geração que ai está e para que possamos enxergá-la é preciso escutarmos sem os ruídos de achismos e jargões é preciso buscar novas formas , re inventar e estudar processos de desenvolvimento humano. De que forma podemos mediar conhecimentos diante de um mundo marcado pelo excesso de informação circulante? O que é essencial que meu aluno aprenda? De que forma desperto nele o desejo para o saber? Não poderia estar aí a grande chave de tantos Fracassos não só escolar mas o fracasso na vida?
Quando ocorre o vazio existencial?
Na minha opinião desde que nascemos, somos retirados “brutalmente” do útero materno por onde vivemos ali por um tempo, quentinho e seguro; de repente somos arrancados de lá, separados de nosso porto seguro para habitar neste mundão frio, onde a partir daquele momento acontece uma sucessão de separações e perdas; começando por aquela em que eu bebe se percebe separado de sua mãe. O Vazio existencial é para sempre; jamais seremos completos, este é o grande vazio existencial; somos seres incompletos sempre. O que nos move é a insatisfação, o desejo de sempre querer melhorar; o dia que não tenho mais desejos estou morto.
Não estaria a nossa Educação fixada em um VAZIO EXISTENCIAL?
Em sua opinião, atualmente qual é maior obstáculo da Educação?
O grande desafio é começarmos a aceitar de que o mundo mudou e com ele A meu ver é preciso refletirmos sobre o como estamos fazendo educação, há todo um contexto de Psicanálise e Educação a ser estudado e pesquisado, uma interlocução possível de passarmos a escutar os “apelos silenciosos” que estamos deparando na educação como; fracasso escolar,indisciplina,desmotivação de professores e alunos e tantos outros obstáculos.
É preciso refletirmos quem somos nos nossos desejos , porque nos tornamos educadores e de que forma estamos atuando na educação para que possamos começar a remover nossas barreiras internas de um senso comum que vem tomando conta da educação do tipo: nenhum aluno quer nada com nada, as famílias delegam para escola o que é função deles, o professor é uma vítima do sistema e assim seguimos reproduzindo um discurso vazio de significado sem buscarmos uma solução para tantos desencontros.
Como você define “Educação”?
Educação é um processo constante de transformação, onde cada um é mobilizado a querer saber mais, saber de si para saber do mundo, buscar estratégias para novos problemas e sucessivamente deparar-se com questões novas.
Educar é um processo de tornar-se melhor sempre comparado consigo mesmo, atuar no mundo de uma forma consciente de seu papel, responsabilizando-se por seus atos. Educar é olhar para além daquilo que se percebe e ter metas de onde se quer chegar.
Que mensagem deixa aos congressistas, participantes e a todos os psicopedagogos?
“ Somente alguém que possa sondar as mentes das crianças será capaz de educá-las, e nós, pessoas adultas, não podemos entender as crianças porque não mais entendemos a nossa própria infância. Nossa amnésia infantil prova que nos tornamos estranhos à nossa infância” ( Freud, 1900).
Façam um exercício diário de suas escolhas e lembrem-se: Nós temos escolha continuar ou não em nossa profissão , se optamos em continuar é preciso indagarmos de que forma poderemos transformar nossa prática para que a Educação volte a ser respeitada começando por nós.
Jane Patricia Haddad - Natural de São Paulo e residente em Belo Horizonte há 21 anos Formada em Pedagogia pela Pontíficia Universidade Católica de Minas Gerais, com Especialização em Psicopedagogia pela UNI-BH e Docência do Ensino Superior pela Newton de Paiva e formação em Psicanálise. Palestrante e Consultora. Ministra aulas no Curso de Psicopedagogia na UNI-BH como Professora convidada. Autora do livro: Educação e Psicanálise:valor existencial lançado em 2008 pela editora WAK. Lançará em julho deste ano seu segundo livro:O Que Quer a Escola?Novos Olhares/Novas Práticas também pela editora WAK.
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