Jane Patricia Haddad
Formada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG), Jane Patrícia Haddad é especialista em Psicopedagogia e em Docência do Ensino Superior. Hoje, ela trabalha como psicanalista e psicopedagoga clínica, mas durante 21 anos atuou como orientadora educacional e coordenadora pedgógica.
Autora do livro Educação e Psicanálise: Vazio Existencial, Jane P. Haddad explica que atualmente os adolescentes tentam preencher o vazio natural do processo de perda com o consumo, principalmente por causa dos estímulos da internet e de outras mídias. “Família e escola precisam preservar seu papel de autoridade, de referência para jovens, que carecem de modelos adultos coerentes com seus discursos e ações”, indica ela como solução. Em palestras e cursos sobre a área educacional e familiar, Jane Haddad costuma abordar temas como adolescência, o papel do educador no mundo atual, afetividade na Educação, além de transtornos de déficit de atenção e hiperatividade. Para o caderno ESCOLA, em entrevista por
e-mail, ela enfatizou que tanto os familiares quanto os envolvidos com os alunos têm que se conscientizar que educar é uma parceria em que todos devem estar do mesmo lado.
Por que é tão relevante que o professor dê exemplos de conduta para o aluno? Não seria essa uma função da família?
A Educação, como o mundo, encontra-se em aberto. Hoje nos encontramos com uma carência de modelos para nossas crianças e jovens. O momento atual nos convoca a investigar, indagar, pesquisar, arriscar, errar e até acertar como consequência de tantas buscas. Não é mais possível dividir o que é responsabilidade da família e o que é da escola. O importante é que nós, adultos, sejamos raízes: jogar sementes e não se preocupar com a colheita, sabendo que todo plantio precisa ter raíz para poder crescer. Na minha opinião, o exemplo educa muito mais do que falas soltas e discursos vazio de sentido. Família e escola têm que se conscientizar que educar é uma parceria, em que ambos devem estar do mesmo lado, e que são responsáveis por gerações que se encontram órfãs de referências adultas.
O professor brasileiro, considerando condições de formação e trabalho, tem a possibilidade real de educar positivamente pelo exemplo?
Pontos devem ser levantados sobre a questão "que Educação estamos fazendo?". Ser educador é uma escolha e todas as profissões atualmente apresentam problemas, como salários baixos, desvalorização e tudo mais. Para ser educador é preciso acreditar em primeiro lugar nas relações humanas. Minha pesquisa ainda está em andamento, mas atualmente acredito que há um problema de autovalorização por parte do professor. Jamais seremos valorizados se primeiro não legitimarmos nosso lugar.
Com as novas ferramentas da internet, a atuação de professores em blogs, orkut, twitter, entre outros canais virtuais de relacionamentos, se mostra constante. Qual o comportamento ideal desse profissional nessas redes?
Em primeiro lugar acredito que o professor, o adulto, deva se manter como autoridade e não como "amiguinho" de seus alunos ou filhos. Crianças e jovens sabem fazer uso das ferramentas virtuais e necessitam de orientação e supervisão sobre o mundo virtual (que é um espetáculo sedutor), ao qual eles têm acesso com pouca malícia e vigilância. A internet é um mundo a ser desvendado a cada nova janela, porém é preciso de orientação por parte dos adultos e para que isto aconteça é necessário que o adulto se mantenha vigilante e participativo na vida das crianças e jovens. O professor pode inserir estes instrumentos e redes como parte de suas aulas, onde é possível trabalhar conceitos, valores e crenças. Acompanho muitos educadores que trabalham com blogs em suas aulas e vem dando certo, mas é preciso que se trabalhe primeiro o uso que será feito e o como será feito.
Como educadores e pais podem lidar com a influência exercida sobre as crianças e adolescentes pela internet e também por outros veículos midiáticos? Que papel a escola tem nesse sentido?
Quando não há família presente, não só fisicamente, o jovem cada vez mais se refugia no mundo virtual onde, de alguma forma, pode viver uma vida diferente, viver em um mundo que o entende, que o aceita e, principalmente, que o aprova. No virtual, ele pode ter o corpo ideal, a família sonhada... É o lugar onde ele pode falar sobre si, um falar sem ser escutado e sem ser visto. Estamos criando uma geração zap: incomodou, muda! Só que na vida real não podemos mudar os professores e os pais nem as dificuldades e frustrações. Toda publicidade, de alguma forma, apela para o prazer imediato por meio do consumo. Os adolescentes acreditam preencher um vazio, só que este vazio não é externo como a mídia afirma. O vazio é interno, faz parte do processo de adolescer, do processo de perder. O consumo funciona como um calmante. Sendo assim, não é de se estranhar que a drogadição e a delinquência venham se tornando sintomas emergentes entre os adolescentes. A tecnologia é muito bem vinda, porém requer equilíbrio e limite. Família e escola precisam preservar seu papel de autoridade, de referência para esses jovens, que carecem de modelos adultos coerentes com seus discursos e ações.
A Educação brasileira, hoje, tem como princípio o ensino pelo exemplo?
A Educação brasileira ainda trabalha com o modelo do aluno ideal, do professor ideal, da escola ideal. O que é ser perfeito? Há perfeição diante de seres humanos? Os jovens já crescem marcados pelas expectativas que seus pais depositam sobre eles. Quem sabe, por meio de seus filhos, objetos narcísicos, pais e educadores conseguem se sentir menos culpados pela Educação que estamos sustentando? As escolas estão perdidas em como lidar com a nova família, as relações mudaram, os novos formatos familiares mudam diariamente e nós, educadores, devemos entender nossos alunos de outra forma. Muitas casas já são monoparentais, mães que assumem ter um filho, independente de contar com o apoio do pai da criança. A questão é convidar as escolas e seus educadores a saírem de suas redomas e conhecer outros espaços e conviver com novas modalidades familiares. Não podemos continuar expondo nossas crianças e jovens a critérios equivocados que trazem desconforto para pais, cuidadores e educadores. Não há modelos, o que deve haver é coerência e responsabilidade por parte dos adultos que assumem ter um filho e dos adultos educadores que assumem trabalhar nesta profissão.
Como o professor pode influenciar o aluno positivamente?
Família e escola devem formar uma parceria co-responsável pela Educação. Não há culpados pelo momento atual, o que há em excesso, são isenções. Pessoas buscando culpados por tanto mal estar que ronda nossa Educação. O caminho do exemplo é uma intelocução Escola-Família-Mundo, onde os adultos sejam coerentes entre o que falam e fazem.
< Anterior | Próximo > |
---|