Fonte: Jornal Estado de Minas, Caderno Bem Viver
Publicação: 07/05/2017
Laços Familiares
Ao pensar na tristeza de crianças e adolescentes surgem muitas perguntas, dúvidas, medos e certo espanto. Afinal, são fases da vida que deveria ser mais leve apesar das incertezas, descobertas com o amadurecimento. A psicóloga Cínthia Oliveira Demaria explica que antes de qualquer tristeza, é preciso discutir a fragilidade dos laços familiares atuais. Os pais não são mais próximos dos filhos e eles perderam essa referência, que foi transferida a terceiros, seja do mundo real ou virtual. O enfraquecimento desse laço fez desaparecer um pouco a figura representativa da mãe dou do pai.
Somando isso, alerta a psicóloga está a “culpabilização” dos pais que prepõe a ausência com os filhos nos moldes da sociedade capitalista (consumo) aumentado com a tecnologia. Assim estudos nos mostram que muitas crianças e adolescentes entendem a internet como fonte de aprendizado maior do que a sala de aula e os pais. Antes, pais e professores eram essa “fonte”. Cínthia enfatiza que, se por um lado a internet aproxima as pessoas, permite o contato de pais e filhos que moram separados por exemplo, o excesso é prejudicial. E é preocupante quando ela vira referência, ainda mais porque é tentadora.
A tentação pode se transformar em armadilha diante da fragilidade. “É a dificuldade de lidar com a frustração. Quando se deparam só com as vidas perfeitas das redes sociais o mito da felicidade eles se questionam por que a vida deles também não pode ser. Eles sonham com o que veem e, para complicar, a absorção do mito da felicidade é inconsciente. Essa frustração muitas vezes não é verbalizada dentro de casa, mas na internet, na figura de uma pessoa virtual. Às vezes as blogueiras “perfeitas” são mais referência do que os pais. Aliás, sabe-se mais da personalidade da internet do que o que ocorre dentro de casa, alerta Cínthia Demaria.
INTOLERÂNCIA: De acordo com Cínthia Demaria, somos seres de falta e o problema é que cada vez mais nos tornamos intolerantes “Vive-se o imediatismo, ninguém tolera mais esperar nada a longo prazo, se um adolescente resolve ser “youtuber” hoje, amanhã já quer o patrocínio da Coca-Cola e dinheiro na conta. Se não vem, nasce a frustração. Somos sujeitos do desejo, ele nos move, mas temos que aprender a lidar com ele e com sua falta. Não se pode ter tudo. O problema é que ninguém quer falar sobre a falta, os pais não querem falar. Os filhos podem não externalizar porque não estão a fim ou por vergonha. Mas o responsável tem obrigação de ter um diálogo aberto e, de acordo com a idade, monitorar sim. Não precisa ser autoritário, mas ter autoridade. Afinal são pais.
“ A vida para muitas crianças e jovens está no nível insuportável e quando os escutamos, percebemos que eles falam sobre suas angústias sim. Talvez nós adultos não estejamos preparados para escutá-los, já que estamos tão imbuídos de que eles sejam lindos, felizes e bem sucedidos.”
Jane Patrícia Haddad,
Educadora e psicopedagoga.